sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Nutrição como aliada no tratamento de portadores de autismo e paralisia cerebral

Grupo do Centro Universitário UNA, de Minas Gerais, faz estudo alimentar em crianças e adolescentes com autismo ou paralisia cerebral praticantes de equoterapia e comprova que uma dieta balanceada potencializa sua capacidade de resposta

Belo Horizonte — O tratamento de pacientes com base na equoterapia feito com portadores de autismo e paralisia cerebral ganha um aliado especial: a boa alimentação. Comidas balanceadas e fontes de vitaminas e proteínas bem definidas ajudam a melhorar a qualidade de vida, além de estimular a capacidade de resposta desses pacientes. Estudos feitos por uma equipe do curso de nutrição do Centro Universitário UNA, de Belo Horizonte, comprovam os bons resultados. A pesquisa Transdisciplinariedade em ação, iniciada no segundo semestre do ano passado, analisou, a partir de novos hábitos alimentares, o comportamento e as reações de crianças e adolescentes carentes que praticam a terapia com cavalos no município de Itatiaiuçu, localizado na região metropolitana da capital mineira.

A professora Maria Cristina Santiago, uma das responsáveis pelo projeto, diz que o nutricionista não é referenciado como profissional de suporte à recuperação dos deficientes, ao contrário de outras áreas, como a psicologia e a fisioterapia. Mas os resultados apontam a necessidade de mudanças na composição desse quadro. “Mostramos que a criança com uma condição nutricional ruim, principalmente aquelas com paralisia cerebral, tem resposta melhor até mesmo ao próprio tratamento de equoterapia quando consegue absorver os nutrientes dos quais precisa. O corpo deve estar preparado para reagir ao exercício”, destaca.

No caso do autismo, uma das primeiras providências é a retirada da caseína (proteína do leite) e do glúten (proteína do trigo), dois elementos que estimulam a agressividade nos portadores da doença. A exclusão delas, conforme testado, melhora a sociabilidade e diminui a irritabilidade. Assim, sairão de cena pães e biscoitos, presentes no cotidiano do grupo, para a entrada de alimentos à base de farinha de mandioca, milho e arroz, que não contêm a proteína. O pão de queijo, por exemplo, poderia ser feito sem leite e com a mandioca; e o queijo poderia ser substituído por essências e aromatizantes. Bolos e pães também substituem ingredientes básicos, como leite e farinha de trigo, pelo polvilho.

No grupo das proteínas, os grandes aliados são o ovo e a soja. “O desafio é tentar receitas mais baratas, principalmente com a soja, sempre pensando na aceitabilidade da criança, que precisa reconhecer o que come. Para esse tipo de paciente, o sabor, muitas vezes, é secundário. O importante é a imagem. Mas, se o paladar também for essencial, devemos conseguir um sabor o mais próximo possível, incluindo sempre as vitaminas, sais minerais, entre outros. Deve-se ressaltar que a retirada ou a inclusão de qualquer elemento deve ocorrer devagar”, afirma Maria Cristina.

Quanto a quem tem paralisia cerebral, não é preciso tirar nada da dieta, mas sim estimular o ato de comer. Nesses casos, a grande dificuldade é engolir, por isso, a tendência é ingerir muito líquido, levando a uma desnutrição natural, não provocada pela doença, mas pelo fato puro e simples da falta de comida. Dessa maneira, é preciso coordenar os movimentos de deglutir e mastigar da criança, com uma alimentação muito cozida ou pastosa. “A desnutrição traz problemas que vão comprometer ainda mais o desenvolvimento cerebral. Quantidades insuficiente de proteína e calorias são as que mais lesionam o organismo, deixando a pessoa mais apática e cansada”, alerta a professora. A estratégia é introduzir mais proteínas de acordo com o tipo de paralisia.
Segundo Maria Cristina, a principal questão é como introduzir a comida e fazer com que a criança ingira os elementos dos quais precisa diariamente. “É impossível concentrar 1,5 mil calorias por dia, o mínimo necessário ao organismo, em líquidos. Dessa forma, normalmente, ingerem 800. Um litro da dieta pronta custa R$ 300, valor inviável para a maioria dos pais dessas crianças. E sopa no liquidificador não supre essas calorias. Há solução e provamos isso, mas é preciso paciência”, ressalta. A paralisia abrange um conjunto de deficiências, problema que pode ser resolvido com uma nutrição equilibrada e consequente recuperação da massa muscular.

Continuidade
O projeto-piloto fez intervenção nutricional em 16 pessoas, das quais quatro crianças e adolescentes foram acompanhados e apresentaram resultados positivos. Muitos pais se esquivaram, com medo de as avaliações significarem mais um transtorno financeiro. Em 2011, a expectativa é trabalhar com 30 pacientes, com a meta de sucesso em 15 deles. No ano passado, um dos casos mais notáveis foi o de uma menina de 7 anos, portadora de paralisia cerebral, que depois do acompanhamento da equipe da UNA ganhou 1,6kg em um mês.

Além disso, ela tem constipação intestinal grave, com frequência de uma vez por semana e fezes endurecidas. A regularidade aumentou para três vezes, com fezes pastosas, por causa do tratamento à base de probióticos (leite fermentado), pasta de ameixa preta pela manhã e o aumento da quantidade de fibras na alimentação, com a introdução de farinha de linhaça nas refeições. A garota também tinha dificuldade de comer novos alimentos e só aceitava beber um determinado suco de caixinha, por causa da embalagem — não importava o conteúdo. Foi ensinado à mãe a esterilizar a caixa e pôr dentro dela os alimentos, para a menina identificar o que era familiar, mas mostrando o conteúdo. Com o tempo, ela se acostumou e, hoje, praticamente aboliu o recipiente.

Outro exemplo é de um adolescente de 13 anos, com paralisia cerebral leve, desnutrição moderada e dificuldade de aceitar novos alimentos, além de cansaço constante. Depois de 60 dias, ele ganhou 6kg, cresceu 2cm e apresentou melhora visível na massa muscular. O garoto deve ser inscrito nas próximas paraolimpíadas. “A primeira parte do estudo foi exploratória, mas houve resultados suficientes para continuarmos, sempre respeitando a individualidade e a realidade econômica das famílias. A nutrição é uma solução, não pode ser um problema a mais”, diz Maria Cristina.
 

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