sábado, 16 de novembro de 2013

Crianças com Síndrome de Asperger não têm falta de empatia




 “ Um estudo inovador sugere que as pessoas com perturbações do espectro do autismo, tais como Asperger, não têm falta de empatia – pelo contrário, sentem as emoções dos outros com demasiada intensidade para conseguirem lidar com elas.”

 “As pessoas com o Síndrome de Asperger, uma forma de autismo de alto funcionamento, são muitas vezes estereotipadas como sendo “totós” distantes que se isolam ou robóticos. Mas, e se o que parece frieza ao mundo exterior for uma resposta devido a estar assoberbado por emoções – um excesso de empatia e não falta dela?

Esta ideia faz sentido a muita gente que sofre de perturbações do espectro do autismo e às suas famílias. Também está alinhada com a teoria do “mundo intenso”, uma nova forma de pensar sobre a natureza do autismo.

Segundo Henry e Kamila Markram, do Swiss Federal Institute of Technology, em Lausanne, a teoria sugere que o problema fundamental nas perturbações do espectro do autismo não é uma deficiência social mas, pelo contrário, uma hipersensibilidade à experiência, o que inclui um medo avassalador da resposta.

“Eu posso entrar numa sala e sentir o que toda a gente está a sentir”, diz Kamila Markram. “O problema é que me chega tudo mais depressa do que eu posso processar. Há aqueles que dizem que as pessoas autistas não sentem o suficiente. Nós dizemos exatamente o contrário: elas sentem em demasia.”

Praticamente toda a gente com perturbações do espectro do autismo (PEA) relatam diversos tipos de excesso de sensibilidade ou medo intenso. Os Markrams argumentam que as dificuldades sociais de quem tem perturbações do espetro do autismo têm origem na tentativa de lidar com um mundo onde alguém levantou o volume acima do 10 nos cinco sentidos (físicos) e em todos os sentimentos.

Se ao ouvir as vozes dos seus pais, quando estava sentado no berço, lhe parecesse estar a ouvir a Metal Machine Music do Lou Reed sob o efeito de ácido, provavelmente também iria preferir enrolar-se num canto e balançar-se.

Mas, é claro, este tipo de recolhimento e de comportamento auto-calmante – movimentos repetitivos; repetição de palavras ou atos; evitar o contacto ocular – interfere com o desenvolvimento social. Sem a experiência que as outras crianças têm através das interações sociais normais, as crianças no espectro nunca chegam a aprender a compreender os sinais sutis.

Phil Schwarz, vice-presidente da Associação de Asperger, da Nova Inglaterra, acrescenta, “Eu acho que a maioria das pessoas com PEA sente-se emocionalmente empática e preocupa-se profundamente com o bem-estar dos outros.”

Portanto, porque é que tantas pessoas veem falta de empatia com uma característica que define a perturbação do espectro do autismo?

O problema começa na complexidade da própria empatia. Um aspecto é simplesmente a capacidade de ver o mundo a partir da perspectiva do outro. Outra é mais emocional – a capacidade de imaginar o que o outro está a sentir e, como resultado, preocupar-se com a sua dor.

As crianças autistas tendem a desenvolver a primeira parte da empatia – que é chamada de “teoria da mente” – mais tarde que as outras crianças. Isto foi demonstrado num ensaio clássico. É pedido às crianças que observem dois fantoches, a Sally e a Anne. A Sally pega num berlinde e coloca-o num cesto, depois sai de cena. Enquanto está fora de cena, a Anne pega no berlinde e põe-no numa caixa. Pergunta-se então às crianças: onde é que a Sally vai procurar pelo berlinde dela quando voltar?

A maioria das crianças com 4 anos de idade sabe que a Sally não viu a Anne a mudar o berlinde de sítio e, por isso, acertam. Aos 10 ou 11 anos, as crianças com problemas no desenvolvimento que tenham QI verbal equivalente ao de uma criança de 3 anos, também acertam. Mas 80% das crianças autistas, com idades entre os 10 e os 11, adivinham que a Sally procurará na caixa, porque sabem onde está o berlinde e não se apercebem de que as outras pessoas não partilham do seu conhecimento.

É claro que se você não se aperceber de que os outros vêm e sentem coisas diferentes, provavelmente preocupar-se-á menos com eles.

É preciso muito mais tempo a uma criança autista do que a uma sem autismo, para se aperceber de que os outros têm experiências e perspectivas diferentes – e o tempo que leva este desenvolvimento varia muito. Mas isso não significa que, uma vez que uma pessoa com perturbações do espectro do autismo se aperceba da experiência do outro, não se preocupe ou não queira estabelecer relação.

Schwarz, da Associação de Asperger da Nova Inglaterra, diz que todos os adultos autistas que conhece, com mais de 18 anos, têm um melhor sentido do que os outros sabem do que o teste Sally/Anne sugere.
Quando se trata de não compreender o estado interno de mentes muito diferentes das nossas, a maioria das pessoas também não consegue lá chegar, diz Schwarz. “Mas a maioria não autista tem livre-trânsito porque, se assumir que a mente do outro funciona como a sua própria, tem muito maior probabilidade de estar certo”.

Portanto, quando, por exemplo, uma criança com Asperger fala incessantemente sobre os seus interesses intensos, não esta a dominar deliberadamente a conversa mas, simplesmente, não considera a possibilidade de poder haver uma diferença entre os seus interesses e os dos seus pares.

Em temos do aspecto da preocupação inerente à empatia apareceu, num website para pessoas com perturbações do espectro do autismo chamada WrongPlanet.net, uma discussão acesa que, aparentemente, suporta a teoria dos Markrams e que foi iniciada quando uma mãe escreveu a perguntar se a sua filha, que é empática mas socialmente imatura, poderia eventualmente ter Asperger.

“Se tenho alguma coisa, é uma luta por ter empatia em demasia,” diz um. “Se alguém está aborrecido, eu fico aborrecido. Há momentos na escola em que outros se portam mal e, se o professor ralha com eles, eu sinto-me como se me tivessem ralhado a mim.”

Outro diz, “Não faço ideia de quando ler dicas sutis, mas sou muito empático. Eu posso entrar numa sala e sentir o que todos estão a sentir e acho que isto é bastante comum no SíndromE de Asperger/autismo. O problema é que apanho com tudo mais depressa do que consigo processar.”

Estudos têm descoberto que, quando estão assoberbadas por sentimentos de empatia, as pessoas tendem a afastar-se. Quando a dor de alguém afeta outro profundamente pode ser mais difícil a este ajudar do que afastar-se.

Para as pessoas com perturbações do espetro do autismo, estes sentimentos empáticos podem ser tão intensos que se recolhem de uma forma que aparenta frieza e falta de cuidado.

“Estas crianças, na verdade, não são não-emotivas. Elas querem interagir – só que lhes é difícil”, diz Markram. “É muito triste, porque são pessoas muito capazes. Mas o mundo é intenso demais para elas e, por isso, têm de se recolher.”

Artigo escrito por Maia Szalavitz

 TRADUÇÃO DO ORIGINAL EM:

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